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O custo emocional dos exames

Bem dizia Ric Jones em seu livro, todo exame possui um custo emocional grande dos envolvidos: estamos com 'saúde' até que algum laboratório nos diga que não. Ficamos sempre apreensivos ao abrir um hemograma: será que estaremos anêmicos, nos sentiremos mais cansado de acordo com a porcentagem de hemoglobina apresentada? Conta ele que uma paciente sua, com uma ecografia de qualidade duvidosa, com um em-tese-gigante-tumor, emagreceu quilos e quilos por conta da 'doença'; tornou-se pálida, magra, pele-e-osso, zumbi. Afinal, antes que lhe abrissem o abdômen, descobriu-se que na verdade era apenas a bexiga cheia d'água. Em tempo. As técnicas de exames possuem dois fatores de qualidade: se consegue pegar uma alta porcentagem de problemas (se não deixa passar muitos) e se acusa corretamente os casos (se há poucos falso-positivos). Há de se notar que nem o exame ok garante que teu corpo está bem e nem um exame fora do padrão acuse que estamos doente: é uma questão estatística. Claro, sem parar para analisar a qualidade do laboratório, limitações da técnica e também exames operador-dependentes.

A ecografia obstétrica é um exame que entrou para o lado do entretenimento: faz-se um por mês sem indicação médica clara, às vezes até mais dependendo do medo da mãe. Toda gestação é um processo também emocional, em que cresce cada vez mais nossa percepção do que é estar grávida, como o próprio feto. Para os medos naturais da gestação, precisamos de apoio e amparo, e não guias de US.

Não há um consenso de quantas ecografias são ideais para uma gravidez de baixo risco: aparentemente acredito que a OMS e FEBRASGO recomendem uma no começo para confirmar a data da DUM (veja, CONFIRMAR, porque mesmo no começo existe uma margem de erro de dias), outra no meio (morfológica) e uma no fim (por motivo que desconheço). Em vários lugares do mundo, se faz apenas a morfológica, e a mortalidade materna e fetal não parece ter se alterado.

Dependendo da conduta médica, há uma ou outra indicação para o exame; mas ele é isso, um exame. Depende do operador, da máquina, de mil e uma condições. Está sujeito a falhas como qualquer exame. E mesmo que se encontre alguma coisa, mais raras são as possibilidades de se fazer algo a respeito. Quem faz para 'ver o bebê na TV', 'para se sentir grávida', está indo com o objetivo errado ao laboratório.

Sabe o que acontece com quem procura? Acha. Quem faz exame para 'ver se está tudo bem', vai encontrar algum porém, algum detalhe normal que parece um problema. O próprio nervosismo dos pais, a própria hipocondria da sociedade, a busca por nosso estado eterno de máquina-com-defeito. Há uma confiança tão cega numa máquina e seu operador que alguns médicos chegam a confiar mais nela para medir o crescimento do que a velha fita métrica, que não levaria
mais do que 1 minuto.

Nosso corpo é nosso templo. A natureza mais acerta do que erra, como diria Ana Cris; somos deusas, geramos vida. Não carece ter medo, fazer exames a rodo não dá garantia de nada, aliás, só nos faz ansiedade e mais medo. E imaginar doenças do 0,001%.

Ana Cris já me falou que se somarmos todo o sofrimento da humanidade por falsos-positivos de exame e compararmos com o sofrimento por doenças reais, a primeira parte deve ganhar disparado. Concordo. Temos que viver leve, e nos submetermos à muitos exames só nos faz viver aterrorizados - muitas vezes, tentados a descobrir uma 'doença' que sequer cura tem, ou mesmo com exames que não farão diferença no diagnóstico ou tratamento. Ansiedade e medo à toa.

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