O médico
é o único indivíduo nesta sociedade que pode causar dano físico a outrem sem que isso incorra em crime. Isto
é:
é o único que passa uma faca na sua barriga e você ainda tem que pagar!! Desta forma,
o médico goza
de um status especial. Algo como
o James Bond e sua "licence to kill". Parecido apenas, tá?
Entretanto, essa sua licença especial para "causar dano físico" tem seus limites, e eles se situam na fronteira do necessário.
Se for preciso infringir dano PARA SALVAR a vida, ou estimular a saú
de (como uma cirurgia, uma droga potente, etc...) este tipo
de atitude (que poderia ser vista como agressã
o)
é entendida como válida. Até mesmo salvadora. Acima
de tudo, nobre.
Daí se percebe que um procedimento médico deve estar embasado na superaçã
o dos benefícios estimados sobre os malefícios inerentes
à qualquer intervençã
o.
Se sabidamente estes transtornos inevitáveis nã
o apresentam uma contrapartida explícita
de vantagens em torno da saú
de, existe uma inadequaçã
o de ordem ética.
O adágio primeiro da medicina (
o Hipócrates havia previsto isso)
é "Primum non nocere", isto
é, "Primeiro nã
o cause dano". Com isso se estabelecia um dos pilares fundamentais da medicina:
o princípio da nã
o maleficência.
Cesarianas sem justificativa médica agridem este pressuposto mas....
E as cirurgias plásticas estéticas? Nã
o agridem também?
Se existe uma justificativa "médica" para ter seios apontando para
o teto, deve existir também para nã
o ter dores no pré-parto e para diminuir a ansiedade.
A realidade
é que tais razões sã
o de ordem subjetiva, nã
o quantificáveis...
Se achamos crime cesarianas com hora marcada, deveríamos achar também as plásticas estéticas.
Se acreditarmos que uma
mulher pode arriscar sua vida para ter um nariz menorzinho, podemos também crer que elas podem escolher ter seus filhos da maneira mais arriscada. Como diria
o arquiteto a Neo "Tudo se resume a escolhas".
Em funçã
o disso eu, mesmo reconhecendo a questã
o ética delicada envolvendo cesarianas por demanda materna, prefiro acreditar que as mulheres têm
o direito
de escolher. Maximilian me ensinou muito cedo isso (mas como sempre eu aprendi tarde): "
Humanizar o nascimento é restituir o protagonismo à mulher.
O resto é sofisticação de tutela". Impedir
o nascimento por via cirúrgica sem indicaçã
o, usando
o poder da lei para proteger mães e bebês,
é uma linda
sofisticação de tutela, mas continua entendendo as mulheres como seres inferiores, que precisam ser tutelados para adotar
o melhor caminho a seguir.
Proibir cesarianas, e com isso impedir escolhas ruins, pode ser um tiro no pé. Ao mesmo tempo em que protegemos as mulheres dos problemas
de uma cirurgia as colocamos num patamar inferior da sociedade. Incapazes
de fazer escolhas por si acabam se tornando como crianças, que precisam
de uma mã
o forte a guiá-las.
É preferível a liberdade extravagante
à prisã
o ajuizada.
Acredito que as mulheres devem escolher livremente as suas opções, mesmo que isso as conduza a escolhas tolas, como uma cesariana, na qual acabam perdendo
o "melhor da festa".
03/09/2009 - Partonosso